sábado, novembro 02, 2002

É assim o outro. Esse escuro vasto, intensíssimo. Impenetrável. Sim, é verdade que mergulhamos nele às vezes, mas parecemos tão à parte ao mesmo tempo. Quem pode ver o outro por dentro? Quem pode, sem violá-lo? Quem pode entender o outro? É assim o outro, ininteligível. É assim por causa da nossa pouca força, do nosso pouco ser. Nessa fragilidade extrema e costumeira o ininteligível é sinônimo de inalcançável, de intocável. Tão perto, tão sedutoramente perto. Porque é que o outro seduz tanto, se é tão árduo? Mas seduz, e fascina, e assusta, e atrai, e esgota, e renova. Mata, revigora. E renascemos ainda menores, ainda mais longe, e talvez por isso mesmo ainda sob maior ânsia de o tocar, de o ter. De o ser. Tolice, o outro será sempre outro. Impossível tê-lo, vivê-lo. É assim o outro, esse fazedor de impossibilidades. Que terrível saber o que não somos e o que não podemos. Que terrível não ser, não poder. O defeito do outro é não ser eu.