sábado, junho 18, 2005

Chegou em casa como todos os dias, aquela névoa de cansaço na frente dos olhos. Dirigiu sem olhar, estacionou sem olhar, entrou sem olhar. Olhar as coisas pode ser muito cansativo, ainda mais quando elas te pertencem. Atravessou a garagem, o jardim e a varanda...a varanda. Parecia estranhamente mais espaçosa. Espaço é bom, espaço é bom. Dormiu o sono automático e a manhã automática o fez despertar. Saiu sem olhar, dirigiu sem olhar. O dia todo era como todo dia, e mais uma noite, o espaço. Assim foi por três dias, até a manhã de sábado, que não era automática porque não tinha despertador nem névoa de sono. Preguiça, sol na cara, já alto, o raro luxo de espreguiçar-se. A varanda e suas plantas, pacientes à espera de... não estavam lá. Três marcas redondas no piso, sujeira-pista-denúncia, roubaram as plantas e você nem notou. Nem para pôr uma tranca neste portão. Quem tranca plantas, se elas nunca fogem? Fugiram. Logo agora que se dispunha a garimpar disposição e coragem para cuidar delas e de suas histórias. Sim, porque nada vale mais numa planta do que sua história. Vivem muito, vêem muito. Sobraram algumas, felizmente. Se não as maiores (vasos pesados, devem ter ido de carro), ao menos as mais experientes, as de história mais velha e mais viva... regou e cuidou das que restaram, o coração apertado. Não serão mais as mesmas, de qualquer forma. Coisa feia roubar as histórias dos outros. Meio esquecidas, é verdade, mas não sem dono. Não serão mais as mesmas, porque história de planta não recomeça. Desperdício. Aproveitou as mãos molhadas para disfarçar a saudade-raiva-remorso que teimava em sair pelos olhos.

2 comentários:

Anónimo disse...

Onde foi parar sua promessa, de escrever ao menos uma vez por semana?
bjo...

Anónimo disse...

Promessas de escrever... cadernos vermelhos... promessas...