quinta-feira, julho 05, 2001

O casulo permanecia lá, impassível, diante do meu olhar indiscreto e impotente. Parecia tudo, menos vida. Ávida de símbolos, esta humanidade. Metáforas que lhe traduzam o não saber de si mesma. Pois bem, o casulo era cinzento igual a uma tempestade, e um pouco disforme. Eu não gostava do que via, mas secretamente conversava com ele, e não percebia que era porque é muito mais fácil conversar com quem não responde. Eu lhe fazia perguntas cujas respostas vinham de mim, e ele não assentia, nem contestava. Permanecia casulo cinza, imovel, e eu permanecia eu. Tanto o meu crescer quanto o meu diminuir eram eu. Anjo e abutre, comodamente inconsciente tanto de grandezas como de hipocrisias. Sim, porque nada somos mais do que humanidade.
Nada somos e nada podemos mais do que o humano. E lutamos pelo mais-que-humano. Seja o casulo, seja a tempestade, seja vida ou morte, seja a saudade meio absurda de alguém que foi embora de verdade, mas de quem não se conhecia mais do que as palavras; seja a culpa pela saudade absurda e pelo falar dela, o sentir-se tão pequeno... é tudo humanidade, e queríamos mais. E lá estava o casulo-morte-tempestade só pra me lembrar dessa pequenez não mais que humana. Desejei que se abrisse bem ali, diante dos meus olhos, e voasse tudo o que não consigo. Desejei uma certeza mais-que-humana de que as pessoas quando deixam esta vida voam tudo o que a gente não consegue. Mas a única certeza que tive foi a de que se vive nas marcas que se deixa. E no que é mais eficaz esse humano pequeno que somos, do que no marcar o humano? Quem vai embora arde em quem fica por causa das marcas. Mesmo de longe, mesmo sem rosto. Esperei, esperei... talvez visse o casulo vazio, dias depois. Não procurei, porque não veria o vôo. Só as marcas dele, e marcas já tenho muitas.

Sem comentários: