segunda-feira, fevereiro 05, 2001

Eu não sabia o medo do mar.
Medo fácil do mar era fácil, eu não tinha. Medo espanto de água grande, força muita contida e cantante, pulsante. Meximento dilacerado de impunidades, de justiça muito funda, escura e invisível. Medo fácil humano do mar de fora, eu não tinha.
Tinha medos outros, insabidos por medo até de saber. Era mar dentro, também, e esse era medo difícil. Tanto que eu nem olhava, tinha medo do mar que eu era. Alma era no mar, nem voz, nem rosto, era, somente. Eu de muita cegueira, temia imóvel, quedava num fixo de muitas milhas, muitas eras.
- Move-te, olha – claro e limpo o dia, resisti.
Alma me sabia o querer grande, velho e nosso. Eu de silêncio e súplica, o quieto dentro maior que o de fora, Alma veio. Vi-lhe os olhos de entender voz e dor, movi lento, resistindo. Olhei mil nãos antes do último, e o mar.
Eu não sabia o medo do mar de dentro, e o tinha – o medo – tanto que nem olhava, mas olhei, e era força muita, contida, cantante, pulsante. Justiça não vi, de tão fundo, não sei se por ausência ou enormidade. Beleza tanta de surpresas e cheios invisíveis, indizíveis.
Era um gerar constante, eterno dentro do limitado que era eu. E o medo era do gerar, também. Medo fêmea do novo e imprevisível dentro, crescendo, silente ininterrupto, líquido e certo. Medo e desejo. E sonho.
Movia-me eu, mar desassossego de encontro ao que não sei. Busquei rocha que se me devolvesse a fúria, como compreendendo meu mover tolo e ordenado. Rocha de suportar e enfrentar, e oferecer-se em chão onde eu caísse, exangue, um retornar de mim, explodindo.
Mas era só praia, um aceitar escorrido e largo, morrendo lento. Devolver de mim, sem fúria, desmanchante. Rejeitei o eu-mar sem fúria, que a fúria era eu, paixão explodindo tola e sempre, e sem volta, que a praia apagava. Eu apagava. Chorei.
Olhei Alma por um instante, será que também chorava?

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