quinta-feira, junho 27, 2002

A primeira metáfora havia sido do Drummond. Treze, quatorze anos, talvez. Atravessara-lhe de uma só vez.

"Como pode existir, pensou consigo..."

(era o marciano que pensava, o que encontrou o Drummond na rua)


"...um ser que no existir põe tamanha anulação de existência?"


A anulação da existência ficou ali entalada, talvez para sempre. Talvez porque até ali - e não tinha ainda esse pensamento pensado, só sentido - existir fosse a própria anulação, uma vez que era um existir passivo e então parecia sinônimo de esperar.
Esperar.
Coisas e pessoas, momentos, iniciativas, coragens. Esperar. O fim do dia, o fim da semana, o fim do mês, o fim do ano... O fim.
Esperar o tempo certo. 'Tempo' e 'certo' não combinam se o assunto é vida. Nada mais incerto que o tempo.
Odiou o marciano e o Drummond.


Não seria a única, esta. Viriam outras. Foi-se tornando lenta e progressivamente mais vulnerável a elas. Até a escravidão, quase consciente, quase voluntária. Persiste ainda a anulação da existência atravessada lá dentro. Talvez ainda hoje seja este o motor de todas as outras metáforas. Anular a anulação.
Falar, ouvir, rir, chorar, correr, atirar-se, morrer, acabar, recomeçar. Fazer certo o mais incerto dos tempos - agora. Amar o marciano e o Drummond.
Existir, ou ao menos tentar.

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