segunda-feira, junho 04, 2001

Vai, pode ir. Pega o teu fardo leve e vai. É hora, e é tarde. Anda! Não me pergunte onde, que não sei, que nada sei nem de mim, mas sei do que podes, de um pouco do que podes. Do que não posso, sei tudo. Vai em silêncio, mas só dentro, aqui onde foste verdade. Leva a tua verdade-mentira, e procura pouso em lugar que te aqueça, que não gostas de frio.
Não te chorarei. Não há motivo. Vais porque tens que ir, que não és meu, mas de quem te acolha. És de quem quer que tenha a sorte, corra o risco, pague o preço. És de qualquer um e de ninguém! Vai! Leva minha dor e meu prazer, minha ânsia de vida e minha morte diária. Voa lento, que vejas o mundo. Tens tão pouco, e é tanto. Vê o de tão humano que há em tudo, que és tu mesmo fruto do humano.
Olhamo-nos com desnecessária profundeza, que éramos um. Mas por que tanto a dizer, não sei. Era o dito ali partindo sem pena, partindo fúrias e silêncio, partindo-me. Quis ir junto, tolices de Alma nunca antes tão pequena. Calei, em brados.
Se assombração não sei, tremi. Delírio loucura fantasia e ali palavras, letras vivas de vida minha, de pé à minha frente, desafio. Olhar altivo de muitos saberes ocultos, todos ali, num só, e me olhava. Não perguntei o que queria porque quem queria era eu, e tanto, tão longe, tão velho. Verso-gente de muita beleza e pouca razão, de respostas de Alma, que agora era sombra de medo e dor. Medo de dor. Me era leve aquele estar sem palavras, que delas o peso ia todo em verso, fora, mas eu sabia que por pouco. Tanto a dizer e nada digo.
Silêncio ainda, memória viva de quase sangue. Um quente espesso de muita letra antiga. Dor antiga gozo dúvida angústia tudo de antes e de agora, palavras de onde nem sei, tantas já havia abrigado. Vida que ferve longe e vem em vapor de palavras luzes sons incertos indigentes, voando procurando abrigo. E ficaram, vívidas dormentes indeléveis. Sempre pra sempre.
Vai depressa! Importa o que farão de ti? Importa o que farás, se vida ou morte ou névoa ou luz? Importa mais que a vida, mas é grande e não sei grandezas. Sei palavras lágrimas muito débeis, tua força toda sangue e seiva. Sei tua força minha, mas vais agora porque é tempo e nada mais sei. Pousa leve no teu destino, e dá do que tens ao que encontrares. Abriga-te agasalha-te mas não te protejas, que só te há de dar guarida quem sabe queimar em troca de luz de sol, de brasa sobre pele, sobre Alma...

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