sexta-feira, março 02, 2001

Era preciso tocar o fogo...
Fogo medo e não dor. Calor muito obstáculo, movimento. Fogo parede imóvel tremeluzente. Era mais. Fogo de um mais sobre o outro. Cíclico infinito, eu em círculos.
Alma era no meio do fogo. Consumia e voltava e falava um fluido de luzes.
- Por que te assustas? Toma. É teu. – Não havia o que tomar, e era muito mais um se deixar tomar. Luz calor e medo, medo do não-fogo em volta.
O não-fogo era sempre grande, fundo, forte como um fim. Sobre fogo, sobre Alma. Urdido de nãos amontoados e escuros, ignorante de luzes muitas. Mas havia um senão oculto, ignorado de muito mas não de tudo, que Alma olhava com olhos de um saber velho e sereno daquelas enormidades. Ergui olhos tristes de ver que o fogo grande não tocava o não-fogo, ainda escuro, porém quente. Temi.
O não-fogo era sempre novo, espesso, certo como um não. Sobre vida, sobre tudo. Sabido de fins imaginados, temidos, absorvente de sonhos velhos. Mas havia um porquê discreto, dissimulado à vista mas não ao toque, que Alma tocava com dedos de um querer grande e seguro daquelas fragilidades. Abri braços lentos de achar que o fogo grande não minava o não-fogo, ainda inteiro, porém frouxo. Cessei.
Havia o de fora, frio e certo. Não-fogo todo e inteiro, e escuro e inerte. E era tudo. Sabido de ver mais do que conceber, que alma levava onde fosse em jatos. Sabido de olho e toque, os nãos eram ali, fogo dentro. Vez por outra era luz fugaz, de pouco estar fora, mas era, e forte, bela independente de raiz funda, e tão longe que abria cores quentes em todo o escuro, alvas muitas rápidas repetidas por sóis quase pequenos, não fossem as bases largas invisíveis. Vez por outra, e muito, e quase sempre, eram nãos, e escuro e espera.
- Abre os olhos, dá-te a ti, toca e olha. – Alma dizia o sempre, o nosso, que não haveria de ser mergulho louco, que louco já era o fogo, o vôo. Seria sim toque tato, descoberta. Toque olhado e sabido, e marcado em luzes nas mãos e nos olhos. Haveria de ser o não-se-temer em Alma, e em fogo.
E era fogo dentro a ser tocado, e era medo, e Alma nele. Alma tão nele que não se lhe via o fim. Tudo quente imóvel fogo-Alma vibrando descompassado. Bruto de intensidades fluidas etéreas, sem som, silêncio absoluto absurdo de trovão recente. Calor nos olhos, luz muita, medo sumindo. Tateei com os olhos, círculos em volta. Cíclico infinito, eu em círculos. Fogo nutrido de si mesmo e de Alma, crescendo nova nutrida do fogo, e sempre, cíclico infinito atemporal. Meu de se tocar.
Estendi-me e avancei. Não era preciso o toque. Ele era o próprio fogo.
Fora ainda e sempre escuro e espera.



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